Cartilaginoso

Beu, C.C.L.; Guedes, N.L.K.O.; De Quadros, Â.A.G.¹

  O tecido cartilaginoso (cartilagem) é um dos tecidos conjuntivos especiais, de consistência rígida, no qual as células são denominadas condrócitos e a matriz extracelular é altamente especializada. O tecido é avascular e, por isso, ocorre, na matriz extracelular, difusão de substâncias entre os condrócitos e os vasos sanguíneos do tecido conjuntivo circundante, denominado pericôndrio. A ausência de capilares limita a espessura das cartilagens.

  A matriz extracelular é flexível devido às suas propriedades elásticas, porém é sólida e firme. As características da matriz extracelular possibilitam que a cartilagem se adapte bem à sustentação de peso, particularmente, em articulações sinoviais. As cartilagens também são essenciais para formação e crescimento de ossos longos, dão suporte às estruturas moles e revestem superfícies articulares para absorver choques e facilitar o deslizamento de ossos nas articulações. Estas funções dependem da estrutura da matriz extracelular, constituída por colágeno (ou colágeno e elastina) e proteoglicanos, ácido hialurônico e glicoproteínas.

  As cartilagens são classificadas em hialina, fibrocartilagem e elástica, de acordo com as características da matriz extracelular.

Cartilagem hialina

  A cartilagem hialina é o tipo de cartilagem encontrada com maior frequência no corpo humano. Esta cartilagem forma o esqueleto inicial (molde) do feto, como precursora dos ossos cujo desenvolvimento é por ossificação endocondral para formação do esqueleto ósseo. Enquanto ocorre o desenvolvimento endocondral, a cartilagem hialina também funciona como placa de crescimento epifisário, localizada entre a diáfise (corpo do osso) e a epífise (extremidade) de um osso longo,  que é funcional durante o crescimento em comprimento.

  A cartilagem hialina, em adultos, está presente na cartilagem articular dos ossos, no esqueleto cartilaginoso das cavidades nasais, na traqueia, na laringe, nos brônquios e nas cartilagens costais. A cartilagem forma um arcabouço estrutural que mantém as vias aéreas abertas na traqueia, brônquios e laringe. As cartilagens hialinas, especialmente as costais e da laringe, tendem a tornar-se ossificadas após a adolescência.

Matriz

  A matriz da cartilagem hialina é vítrea, homogênea e amorfa. Na matriz da cartilagem há espaços, denominados lacunas, os quais são ocupados por condrócitos. Fibrilas de colágenos (principalmente tipo II), relativamente delgadas, e substância fundamental formam a matriz extracelular.

  A substância fundamental da cartilagem hialina é formada por glicosaminoglicanos (ácido hialurônico, condroitin-sulfato e queratan-sulfato). O condroitin-sulfato e o queratan-sulfato formam um monômero de proteoglicano. O ácido hialurônico está associado a unidades de proteoglicanos formando grandes agregados ligados às fibrilas de colágeno.

  A cartilagem é muito hidratada, uma vez que 60 – 78% de seu peso líquido é devido à água que em grande parte está ligada e, assim, possibilita a elasticidade deste tecido. Uma pequena parte da água tem ligação frouxa para que ocorra difusão de pequenos solutos. Alterações regionais no conteúdo de água ocorrem na cartilagem articular durante o movimento e quando ela é submetida à pressão. A matriz da cartilagem hialina pode ossificar, normalmente, quando: entra em contato com o osso na cartilagem articular; é substituída por osso durante o período de crescimento do indivíduo; ou ocorre processo de envelhecimento.

  Os componentes da substância fundamental não têm distribuição homogênea, o que pode ser observado em preparados histológicos corados com hematoxilina e corantes básicos devido à basofilia de proteoglicanos sulfatados, cuja maior concentração ocorre imediatamente em torno da lacuna, aparentando um anel de matriz intensamente corado e denominado cápsula. A concentração um pouco menor em torno de grupos celulares é denominada matriz territorial. As áreas da matriz mais distantes das células têm menor concentração de proteoglicanas sulfatadas e são denominadas matriz interterritorial. A quantidade de proteoglicanos também é diferente de acordo com a idade porque diminuem à medida que a cartilagem envelhece.

Condrócitos

  O citoplasma dos condrócitos ativos na produção de matriz tem áreas de basofilia (indicam síntese de proteínas) e áreas claras (indicam presença de aparelho de Golgi). Os condrócitos secretam colágeno (colágeno II, principalmente), proteoglicanos e glicoproteínas. Células menos ativas e mais antigas têm redução na área ocupada pelo aparelho de Golgi mas as gotículas lipídicas e o glicogênio, do citoplasma, também podem ser observados como áreas claras. Além do aparelho de Golgi bem desenvolvido, outras organelas dos condrócitos são: retículo endoplasmático rugoso, grânulos de secreção, vesículas, filamentos intermediários, microtúbulos e microfilamentos de actina.

  Os condrócitos periféricos são mais alongados enquanto que os localizados mais profundamente na cartilagem são arredondados e organizados em grupos de até 8 células, denominados grupos isógenos, nos quais as células são originadas do mesmo condroblasto.

  Os condrócitos em adultos estão situados em grupos compactos ou podem estar alinhados em fileiras. Os grupos são formados devido às várias divisões sucessivas durante a última fase de desenvolvimento. Tais grupos são chamados isógenos – o que indica que têm origem da mesma célula precursora.

Pericôndrio

  O pericôndrio, tecido conjuntivo que serve como fonte para novas células cartilagíneas, geralmente, circunda a cartilagem hialina, porém não ocorre na superfície de cartilagens articulares e no contato da cartilagem com superfície óssea. O pericôndrio também é importante para que ocorram nutrição, oxigenação e eliminação de restos metabólicos já que ele é vascularizado e a cartilagem, não.

  Tecido conjuntivo denso e células semelhantes a fibroblastos formam o pericôndrio que é dividido em uma camada celular interna, chamada condrogênica – a qual dá origem às células cartilagíneas – e uma externa, mais fibrosa.

Cartilagem elástica

  A característica da cartilagem elástica é a matriz rica em fibras elásticas e lâminas de material elástico, além de fibrilas de colágeno e da substância fundamental. Os componentes elásticos conferem maior elasticidade à cartilagem. A maior parte das estruturas que têm cartilagem elástica têm funções de vibração, como é o caso da laringe para a formação de som ou da orelha externa que capta as ondas sonoras.

  A cartilagem elástica é resistente à degeneração, porém seu grau de regeneração é limitado após sofrer lesões.  Este tipo de cartilagem ocorre na laringe (cartilagens corniculada, epiglote e parte das aritenoides), tuba auditiva e na orelha externa.

Fibrocartilagem

  A fibrocartilagem é um tecido fibroso, branco, denso, fasciculado e opaco que contém fibroblastos e pequenos grupos interfasciculares de condrócitos. Suas células são ovoides e rodeadas por matriz concêntrica estriada. A matriz da fibrocartilagem contém feixes grandes de fibras colágenas espessas (principalmente colágeno tipo I) que podem ser observados em secções coradas com hematoxilina/eosina.

  A fibrocartilagem ocorre nos discos intervertebrais, sínfise púbica, discos articulares (articulações temporomandibular e esternoclavicular), meniscos da articulação do joelho e em certos lugares onde tendões se ligam aos ossos. A fibrocartilagem ocorre, geralmente, em locais nos quais o tecido precisa resistir à compressão e ao desgaste. Em estruturas como os discos intervertebrais, nos quais está em grande quantidade, a fibrocartilagem tem grande resistência à tração e considerável elasticidade. Quando ocorre em quantidades menores como no lábio glenoidal (na articulação do ombro) e acetábulo (na articulação do quadril), a fibrocartilagem proporciona elasticidade e resistência à pressão e atrito repetitivos. É um tipo de cartilagem resistente à alteração degenerativa.

Histogênese

  A cartilagem, em geral, tem origem do mesênquima. As células mesenquimais tornam-se arredondadas e formam uma massa celular com pouca matriz extracelular, onde a cartilagem deve desenvolver. A massa de células é denominada blastema e começa a produzir matriz cartilaginosa. As células nesta fase são os condroblastos, que gradativamente se afastam à medida que continuam a deposição de matriz extracelular. Essas células tornam-se condrócitos quando estão completamente circundadas por matriz. O tecido mesenquimal que circunda a massa condrogênica forma o pericôndrio.

Crescimento

  Os tipos de crescimento da cartilagem são aposicional e intersticial. No crescimento aposicional há formação de cartilagem sobre a superfície de cartilagem já existente por células provenientes do pericôndrio. Já o crescimento intersticial ocorre no interior da cartilagem pela divisão dos condrócitos. As células-filhas ocupam temporariamente a mesma lacuna e separam-se quando começam a secretar matriz. O crescimento aposicional é mais importante do que o intersticial, porque, à medida que a matriz torna-se mais rígida, o crescimento intersticial não é viável e a cartilagem cresce apenas por aposição.

  A cartilagem tem pequena capacidade de recuperação quando lesada. Se houver reparação, esta será devida à atividade do pericôndrio e só em pequena escala devido ao crescimento intersticial.

¹ Como citar:

  • Nas referências: BEU, C.C.L.; GUEDES, N.L.K.O; DE QUADROS, Â.A.G. Tecido conjuntivo, 2017. Disponível em: . Acesso em: 03 de mar. 2017. (conforme data de acesso ao site);
  • No texto: Beu et al. (2017) ou (BEU et al., 2017).

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